Ao som dos primeiros movimentos, lembro-me da fatídica viagem, de como e de quando lá chegamos. Um pequeno povoado. Deserto, poeirento e debaixo de um sol de cozinhar. Entramos. A taberna era rústica e suja. Mariachis dedilhavam suas guitarras ao fundo. Ao longe, um lamento forjado ao sopro de um trompete. Violinos orquestrados compunham, por fim, o cenário. O taberneiro suarento, sempre esfregando as mãos numa toalha encardida, nos serviu, em tigelas de barro, algo muito travoso para ser vinho. Ela não gostou. Nada que lembrasse as sessões homéricas de vinho tinto, uvas Itália e morangos silvestres. Ao lado, uma linha, uma velha estação, o vaivém barulhento de uma porta. A civilização já passou por aqui. É. Brincando, ela fez um longo enquadramento com as mãos. Tarantino ou Sérgio Leone? O original, eu disse.
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Enquanto o trompete agoniza, entrecortado pelo dedilhar suave sobre a harpa, lembro também de como, aproveitando uma pequena trégua, tentei penetrar aqueles olhos, mas os cabelos, desalinhados pelo vento, debatiam-se por sobre o rosto, tirando-me a visão das amêndoas negras. Se os visse, se os penetrasse fundo, imaginei, talvez a demovesse da idéia, como naquele final de tarde em que, ao fim, embeberam-se uns nos outros, brilharam-se uns pros outros e juraram-se uns aos outros.
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Queria uma última chance. Julgava que tinha me esforçado. Tanto que, no prelúdio, os dedos ainda se tocaram, embora sem a harmonia de antes. Mas logo percebi que seria impossível reproduzir o monólogo das mãos.
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E nada foi mais doloroso do que o movimento final, anunciado pelas notas graves e marcadas do violoncelo. Quando, de repente, se ergueu e selou-me o rosto com um beijo. Meus olhos cerraram-se, repeliram qualquer movimento na tentativa de reabri-los. O receio era o de perceber o óbvio. E sumiu lentamente na poeira arrastada pelo vento - que também abria e fechava portas -, nas ondas tremulantes de calor. Ficou a sensação de uma miragem, nada além.
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Nunca mais a vi. A não ser quando ouço concierto de aranjuez, como agora, na voz de Nana Mouskouri. Milles Davis que me perdoe com o seu adágio.
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É noite de natal. Mais alguns instantes e os ponteiros estarão sobrepostos. O vizinho do lado ouve Noite Feliz. Que vinho ele bebe, não sei. A mulher corre pra cozinha. As crianças, em torno da árvore, aguardam com ansiedade a chegada do bom velhinho.
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Pobres coitados. Pobre de mim.
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Não sei qual dos mundos merece mais compaixão.
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J. L. Rocha do Nascimento.
Extraído do Blog Confraria Tarântula
Um comentário:
Vasculho os "escombros" e "superficies " da web em busca de blogs que sejam relevantes. Achei o seu . Parabéns.Continue nos presenteando com suas atualizações.
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