sábado, 8 de novembro de 2008

Confidências de Amandra - I

.(foto "solta" na internet, sem crédito).

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Quando eu tinha doze anos era uma menina magra. Na escola meninos chatos viviam me irritando, me chamavam de magricela, no que eu partia para o ataque (tinha ossos de ferro) e abatia-os com vigorosos socos. Eram constantes minhas idas à diretoria por causa da minha conduta violenta. Os professores toleravam minha atitude - minhas notas compensavam o desajuste agressivo, pois eu gostava muito de estudar. Eu me identificava mais com as matérias de português e de história. Em casa, deitava-me de bruços na cama na companhia de deliciosos sacos de balas, caixinhas de nescau líquido, sorvetes e livros, muitos livros. Lia poesias, romances, biografias, a história da Grécia e Roma antigas, Hitler e a Segunda Guerra Mundial. Era apaixonada por essas leituras.
Balas? Nescau? Sim! Apesar do corpo magro eu comia bastante. Minha mãe, nas refeições, caprichava o meu prato. Eu adorava panelada, rabada, lingüiça, costela assada. Nas manhãs preparava todos os dias a mochila para minha estadia na escola. O caderno, livros didáticos e comida: doces, bolachas, chocolates que eu comia durante as aula, quando o professor se virava para copiar no quadro – nesses momentos se algum colega me delatasse sabia que ia passar por maus momentos no intervalo. Durante o recreio eu torrava os reais que minha mãe, preocupada com minha magreza, me dava. Devorava os salgadinho mais gordurosos: bomba, coxinha, espáduas... massa mesmo eram os pastéis de carne, até hoje sinto saudades daqueles pasteizinhos da cantina da Paixão, que delícia.
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Um dia, em sala de aula, um professor contou uma piada. Era o professor que eu mais gostava, eu guardava uma paixão secreta por ele. Até hoje eu me pergunto por que ele me desapontou daquele jeito. Tá certo que sempre fui tímida, nunca externei qualquer gesto que fragilizasse a muralha do meu ser adolescente, sempre media a cor do meu olhar com ele. Você deve estar perguntando o quê é isso. É o brilho dos olhos que denuncia a cor de uma paixão, as pessoas puramente apaixonadas revelam isso, principalmente às mulheres, notadamente as adolescentes que não sabem o que fazer com o amor que sentem, pior ainda com a paixão as corrói.
Mas estou me distanciando do assunto. Mas também não estou com pressa, o senhor está? Certo, o leitor, ou o cliente, sempre tem razão. Pois bem, piada, ao contrário do que pensa a maioria, “riso da alegria”, não é nada disso. É o riso da dor meu caro, a cartase do Aristóteles que se manifesta em gargalhadas. As pessoas em meio de uma multidão de idiotas sorridentes não estranham ser mais um, e palmas para o comediante, o palhaço moderno.
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Quando criança eu adorava circo, os palhaços eram minhas atrações maiores. Virei adolescente e continuava a freqüentar os circos que se armavam no bairro onde eu morava. Mas alguma coisa tinha mudado. Eu perdera a inocência e os palhaços também; a televisão comprou o circo e, apesar de tentativas desesperadas da mídia capitalista, não conseguiu (e nem podia) fazer voltar à inocência de uma velha geração.
Já adolescente fui a um circo, pequeno, que se instalara no meu bairro. Sorri bastante dos palhaços, especialmente de um. Ao final do espetáculo, o palhaço que eu, e o público, simpatizara, teve direito ao cumprimento do público no final. Cortinas foram abertas e ele apareceu com sua família: uma dançarina e um garoto que era aprendiz na corda-bamba. Pelo discurso que fez me deixou desanimado da profissão de palhaço. Sim, eu, nos meus sonhos, queria a inteligência de um palhaço para fazer a humanidade sorrir. Mas ele não fez exatamente um discurso, declamou uma longa poesia, dele mesmo. Sentado no palco, microfone na mão, palavras afetivas, sílabas de vida, rimas de lágrimas. O público ficou comovido. Depois desse dia, apaguei todos os sorrisos de palhaços que eu sabia imitar. Perdi muitas amigas e amigos que só me queriam como palhaça. Foi aí onde eu percebi que piada era o riso da dor. Hoje em dia eu escuto piadas: em roda de amigos; em seminários - quando o seminarista querendo descontrair (ou enrolar) o público; na família a gozação é dobrada. Mas nunca esqueci daquele palhaço chorão, e hoje, toda piada que escuto, se existe graça, existe também lágrima no riso de quem entende a piada. Mas eu tava falando mesmo de quê? Ah, da minha pré-adolescência, como eu comia! Eh, eh...
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(Esse folhetim continua na próxima semana)

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