(imagem - mercado livre)
O violino
Ele chegou numa manhã de novembro, quando os professores já estavam fazendo revisão para as provas finais. Era moreno escuro e tinha cara de índio, cabelo liso caindo na testa. Parou à porta da sala, segurava um estojo de violino, disse que a diretora havia mandado ele para a sala 07. O Johane, que não tolerava atrasos de alunos, parou o pincel que escrevia no quadro e observou aquela simplicidade rústica na porta. Balançou vagarosamente o rosto em afirmação e o menino adentrou, aprofundando silêncio nos olhos da turma. Sentou-se numa carteira dos fundos. Durante cinco minutos o professor Johane finalmente conviveu com o silêncio naquela sala. Mas precisava recomeçar a aula. O menino se chamava Aquiles.
— Aquiles de que?
— Só, respondeu.
Não ia discutir. Anotou na lista de chamada o nome Aquiles. A secretaria tomava conta dos detalhes burocráticos.
— Trouxe caderno, lápis, caneta etc.?
Abriu o estojo do violino e retirou o material.
— Toca violino?
— Quando necessário.
Aos poucos a turma se encontrou na sala de aula. Beatriz levantou a sua dor de cabeça e levemente girou os olhos verdes até o novato. Os meninos, corrompidos pela atração, deram voz.
Ele chegou numa manhã de novembro, quando os professores já estavam fazendo revisão para as provas finais. Era moreno escuro e tinha cara de índio, cabelo liso caindo na testa. Parou à porta da sala, segurava um estojo de violino, disse que a diretora havia mandado ele para a sala 07. O Johane, que não tolerava atrasos de alunos, parou o pincel que escrevia no quadro e observou aquela simplicidade rústica na porta. Balançou vagarosamente o rosto em afirmação e o menino adentrou, aprofundando silêncio nos olhos da turma. Sentou-se numa carteira dos fundos. Durante cinco minutos o professor Johane finalmente conviveu com o silêncio naquela sala. Mas precisava recomeçar a aula. O menino se chamava Aquiles.
— Aquiles de que?
— Só, respondeu.
Não ia discutir. Anotou na lista de chamada o nome Aquiles. A secretaria tomava conta dos detalhes burocráticos.
— Trouxe caderno, lápis, caneta etc.?
Abriu o estojo do violino e retirou o material.
— Toca violino?
— Quando necessário.
Aos poucos a turma se encontrou na sala de aula. Beatriz levantou a sua dor de cabeça e levemente girou os olhos verdes até o novato. Os meninos, corrompidos pela atração, deram voz.
--- Aquiles não é nome de grego, professor?
--- Índio toca violino, professor?
--- Aprendi que índio toca flauta, tambor, pandeiro... e também...
--- A nona de Beethoven!!!
Gargalhada geral. O professor ameaçava os espertinhos. Mas a confusão já havia se firmado. Quando Beatriz, com algum esforço se levantou, e levantou o braço, a turma se calou. Beatriz não era de se levantar, muito menos de falar. Susto ou surpresa?
--- Que tal a turma pedir ao novato tocar o que estão pedindo, não é a nona de Beethoven? Então vamos pedir para ele tocar, com a permissão do professor, claro!
Johane olhou o silêncio da turma, nunca ouvira Beethoven mesmo.
--- Concedido, que toque "o nono" de Beethoven!
O novato Aquiles distendeu a cabeça, diszepou o estojo e retirou o instrumento com o cuidado que uma mãe acorda seu filho. Apoiou o violino entre seu ombro e o queixo quadrado e deitou o arco sobre as quatro cordas do violino. Numa carícia leve ele iniciou a execução do segundo movimento da nona de Beethoven. A hostilidade relaxa aos prazeres da competência. Aquiles tocou o trecho da sinfonia que todos ali pareciam fazer parte com algum instrumento da orquestra.
Outros dias se passaram na escola, mas Aquiles não levava o violino. Todos reclamavam, mas ele dizia que só em momentos necessários.
Uma vez era recreio, Beatriz dos olhos grandes verdes e de cabelos longos lisos negros se encontrava sozinha sentada num dos degraus que dava acesso ao grande palco, no pátio da escola. Aquiles, acompanhado de um pacote de biscoito de chocolate.
--- Pão ou bolacha aproximam as pessoas, sabia?
--- Li frases mais interessantes: "pão aproxima as pessoas; vinho aproxima a poesia".
--- Isso é frase de gente grande.
--- E nós só temos treze anos de idade!
--- Você ainda sente dores?
--- Ainda não, sua música vale sete dias. Mas sinto que do Natal não passo.
--- O que você prefere: Beethoven - que não é para a sua idade, é só uma recomendação ; Vivaldi, a sua gloriosa primavera, como eu gostaria ; ou prefere ser Bach, na grande música multisecular?
--- Na hora a sua inspiração diz, tá? Me dá um beijo!
--- Ainda somos crianças, na hora eu te beijo na boca.
Vésperas do natal, Beatriz morreu. Os médicos atestaram câncer no cérebro. O rosto da menina tranquilizava a fila de olhares que ali a visitavam. Antes do sepultamento, compareceu ao velório um violinista que ali sacou, diante dos olhares disciplinados da morte, seu violino e tocou treze minutos de a primavera de vivaldi.
Nos primeiros dias de janeiro, na escola onde Beatriz estudava, estava programado a entrega das provas finais aos pais dos alunos. professores da escola fizeram "plantão" para entrega das provas. A ocasião era de plena calma. Mas o professor Johane insistia em conhecer os pais do aluno que aparecera no finalzinho do ano, em novembro. O violinista, cadê os pais do violinista! Perguntava entre filas de mães.
Apelou para a diretoria. Aquiles, o que foi feito de Aquiles?
Não havia registro de nenhum Aquiles na escola.
--- Índio toca violino, professor?
--- Aprendi que índio toca flauta, tambor, pandeiro... e também...
--- A nona de Beethoven!!!
Gargalhada geral. O professor ameaçava os espertinhos. Mas a confusão já havia se firmado. Quando Beatriz, com algum esforço se levantou, e levantou o braço, a turma se calou. Beatriz não era de se levantar, muito menos de falar. Susto ou surpresa?
--- Que tal a turma pedir ao novato tocar o que estão pedindo, não é a nona de Beethoven? Então vamos pedir para ele tocar, com a permissão do professor, claro!
Johane olhou o silêncio da turma, nunca ouvira Beethoven mesmo.
--- Concedido, que toque "o nono" de Beethoven!
O novato Aquiles distendeu a cabeça, diszepou o estojo e retirou o instrumento com o cuidado que uma mãe acorda seu filho. Apoiou o violino entre seu ombro e o queixo quadrado e deitou o arco sobre as quatro cordas do violino. Numa carícia leve ele iniciou a execução do segundo movimento da nona de Beethoven. A hostilidade relaxa aos prazeres da competência. Aquiles tocou o trecho da sinfonia que todos ali pareciam fazer parte com algum instrumento da orquestra.
Outros dias se passaram na escola, mas Aquiles não levava o violino. Todos reclamavam, mas ele dizia que só em momentos necessários.
Uma vez era recreio, Beatriz dos olhos grandes verdes e de cabelos longos lisos negros se encontrava sozinha sentada num dos degraus que dava acesso ao grande palco, no pátio da escola. Aquiles, acompanhado de um pacote de biscoito de chocolate.
--- Pão ou bolacha aproximam as pessoas, sabia?
--- Li frases mais interessantes: "pão aproxima as pessoas; vinho aproxima a poesia".
--- Isso é frase de gente grande.
--- E nós só temos treze anos de idade!
--- Você ainda sente dores?
--- Ainda não, sua música vale sete dias. Mas sinto que do Natal não passo.
--- O que você prefere: Beethoven - que não é para a sua idade, é só uma recomendação ; Vivaldi, a sua gloriosa primavera, como eu gostaria ; ou prefere ser Bach, na grande música multisecular?
--- Na hora a sua inspiração diz, tá? Me dá um beijo!
--- Ainda somos crianças, na hora eu te beijo na boca.
Vésperas do natal, Beatriz morreu. Os médicos atestaram câncer no cérebro. O rosto da menina tranquilizava a fila de olhares que ali a visitavam. Antes do sepultamento, compareceu ao velório um violinista que ali sacou, diante dos olhares disciplinados da morte, seu violino e tocou treze minutos de a primavera de vivaldi.
Nos primeiros dias de janeiro, na escola onde Beatriz estudava, estava programado a entrega das provas finais aos pais dos alunos. professores da escola fizeram "plantão" para entrega das provas. A ocasião era de plena calma. Mas o professor Johane insistia em conhecer os pais do aluno que aparecera no finalzinho do ano, em novembro. O violinista, cadê os pais do violinista! Perguntava entre filas de mães.
Apelou para a diretoria. Aquiles, o que foi feito de Aquiles?
Não havia registro de nenhum Aquiles na escola.
F Wilson
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