sábado, 20 de novembro de 2010

Na sala de aula

(foto sem credibilidade nenhuma)

Para Anchieta Fernandes, meu irmão, que me contou essa história.


Cueca de bolinhas

Era um professor severo, sábio. Quanto a isso nenhum aluno questionava. Talvez a eficiência no seu processo didático se desse além da objetividade: na ausência de lirismo e até mesmo na sua desmaterialização pessoal.

Mas o modismo impõe aos tempos certas normas estilísticas exteriores ao indivíduo. E a mídia avisa infernalmente: ou você me acompanha ou é criticado, passa o vexame dos diabos. Até mesmo a sua mulher, ou namorada,  evitam sair com você.

E o cidadão que ignora a mídia, não consegue seu lugar nessa sociedade de rimas banalizadas pela moda do corte da tesoura? (Quando adolescente eu usava ridículas calças boca-de-sino e sapatos cavalo-de-pau).

Então o cidadão que se descuida da criação de acessórios fundamentais para se vestir no mundo de hoje é penalizado. Ele, crente em sua sinceridade de ordem interior, pessoal, se vestindo à jurisprudência social, acaba sendo  sacaneado pela ditadura da roupa que não mais tolera o sujeito vestir cueca de bolinhas?

Aconteceu com o professor Jurismar. Alunos do pré-vestibular ainda bocejavam na sala quando o professor entrou. A porta de entrada era pelos fundos da sala. E logo as garotas acompanharam maliciosamente o andar de bolinhas vermelhas do professor Jurismar. Nenhum sinal de atrevimento aconteceu enquanto ele fazia os procedimentos de rotina. Chamada dos alunos, novidades da matéria ( Física ), número de concorrentes no vestibular etc - sentado à mesa,  frente para os alunos que respondiam o “presente” gaguejando o sorriso de vingança tão esperado por eles, alunos.

Fatal a intenção maldosa. Bolas vermelhas se transformaram em sangue no rosto do professor que se voltou e encarou a turma, silenciada abruptamente. A  vida de professor em sala de aula é um lado de composição - no quadro; outro de consonância - frente aos alunos. Mas em dia de bolinhas ninguém escuta música, nessa festa até  Deus e o diabo fazem tim-tim. Refiro-me aos bons alunos e outros aloprados.

A desforra dos alunos feita entre-costas do professor, o barulho desses jovens, as convulsões de evadir o recinto pelo professor é tudo que  aparenta o inferno. Se a revolução tem dois começos, não se vence de um golpe só. Jurismar apelou à direção. Ao deslumbramento do vencedor,  segue sempre  a humilhação, de quem tem o total apoio da autoridade.

O diretor Evandro adentrou a sala com a cara da ordem mais velha ou mais sacra do mundo. Antes mesmo de chegar ao estrado,junto ao quadro, onde Jurismar o esperava, Jesus Cristo, um aluno, interrompeu a caminhada do diretor.
— Diretor, por favor, sente-se entre nós e assista um pouco da missão do nosso professor Jurismar.
 
O diretor olhou o professor Jurismar que assentiu ao reclame de Jesus.
— Tudo bem, professor, faça sua aula, por favor, disse o diretor.
No giro do professor para rabiscar o quadro a gargalhada se derramou mais  ainda com a presença da autoridade.
 
Apesar dos esforços do diretor para que o professor continuasse na escola, Jurismar pediu as contas.

F Wilson     

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