domingo, 25 de outubro de 2009

Conto para criança

(Foto: "canários" - Flickr do Yahoo)

Os cabelos de Clarice
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Clarice saiu do útero da mãe de cabelos longos. uma bebê cabeluda. A enfermeira cortou o excesso para que o corpinho rosado não fosse emaranhado.
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Era um cabelo louro. O mês de junho soprava o vento nos cabelos da menina e fios dourados voavam pelas ruas por onde ela corria. A pianista Aderalda, sua vizinha, recolhia os preciosos fios para marcar colunas de acordes nas páginas das partituras que ela trabalhava diariamente, numa sala onde um piano de dimensões colossais era o mais dramático oratório de uma devotada pianista da catedral Bach.
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Quando a velha pianista morreu, Clarice já tinha sete anos de idade. A casa e o piano ficaram abandonados na casa vizinha e ninguém ainda tinha se apresentado para reclamar o imóvel. A velha Aderalda terminara "moça-velha". Seu último - e parece que único na vida - companheiro, um maestro talentoso, cometera adultério com uma jovem pianista e fora assassinado pela esposa. Mas isso já se passara mais de quarenta anos.
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Quando Aderalda morreu, os cabelos de Clarice começaram a cair. A suave massa sonora que se expressava da vizinha e que alimentava a vida e paixão da menina deixara de existir. Clarice não mais cantava. Tampouco se importava com os fios de cabelos que se espalhavam pelo chão da casa. O vento agora era um canto instrumental monótono, fazia seu trabalho de limpeza: recolhia os fios caídos dos cabelos dela, Clarice.
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Na escola, passou a ser chamada de "menina carequinha". A mãe lhe comprou uma dúzia de bonés.
-- Seu cabelo vai voltar, Clarice, de fazer trança, como Rapunzel, dizia a mãe.
-- Quando, mamãe?
-- Quando você voltar a cantar.
Ela aninhava a menina nos braços e, com lágrimas, pedia a Deus que devolvesse os cabelos e a voz de Clarisse.
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Numa manhã de domingo, era junho, Clarice acordou com uma música vinda de um pé de caju, no seu quintal. Vinha de um ninho de passarinhos. A música instrumental, a feliz sonoridade de faculdade universal de "dizer tudo, embora sem palavras".
Um passarinho ia e vinha, era o macho terminando de construir o ninho - com fios de cabelos, loiros. Clarice sentiu que o idioma musical minado em sua garganta explodia, podia acompanhar o canto dos pássaros, um estímulo que a liberou num impulso de arte, filosofia, religião...
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Esperou o passarinho retornar de sua viagem, constante naqueles dias, da casa desabitada da pianista. Era um canário amarelo, formoso, parecia uma guitarra Fender. Algum tempo depois ele pousou na janela do teatro. Clarice dormia. Depositou fios de cabelos junto ao rosto dela no travesseiro e assoviou uma cantata de Bach. Depois abriu as asas de Deus, com suas penas amarelas, e massageou a carequinha de Clarice.
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F Wilson

sábado, 17 de outubro de 2009

Repost


Fruta
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Como é doce a palavra
Nos teus lábios de açucena
Pele macia na minha alma
Olhar de esperança acena
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Teu sorriso de criança salta
Do rosto feito gente inocente
Que pisa no coração dos conflitos
E voa na contramão do infinito
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Como a lua de todo dia
Teu rosto é a mesma poesia
Como a lua em toda fase
Teu rosto em sedução disfarça
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Fruta madura na casa
Faz poesia nua embriagada
Vinho sangrando tu'alma
Lábios suando rasgados
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F Wilson

Conto de M. de Moura Filho no "Confraria Tarântula"

(foto na net, sem crédito)

A ENCOMENDA
Por M. de Moura Filho

"Atirador, quando compra vingança alheia
Tem que ter veneno na veia
Tem que saber andar num chão de navalha
Atirador tarda mas não falha"
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Atirador, por Lula Queiroga
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Sentado em frente ao homem de branco, viu a mão pálida aproximar-se, arrastando-se no tampo da mesa, pressionando uma foto. Afastou-se rápida, e sumiu por instantes. Uma gaveta abriu-se. A mão pálida voltou segurando um envelope. E ouviu o homem dizer "mate o canalha, e apenas o canalha." Pegou a foto, e mirou-a, mentalizando o rosto do homem morto; sim, já morto. A menos que o envelope não contivesse o valor do contrato. Virou a foto, os endereço impressos: o do trabalho e o de casa. Largou a foto. No envelope, o dinheiro acertado. Não disse palavra. Apenas se levantou e encaminhou-se para a saída. Ouviu ainda o homem de branco dizer que queria no jornal a notícia da morte do canalha. E pensou: "tá lá, doutor."
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Seus olhos miravam o cano da arma voltado para si. Antes recebera uma coronhada entre os olhos, que lhe deixou aturdido, com o corpo atirado ao chão. Tonto, tentou levantar. Não conseguiu se pôr de pé. Mas ajoelhou-se. E seus olhos miravam o cano da arma voltado para si. Olhou para o lado e viu G., inerte. Tentou extrair de seu olhar a traição que sempre esperou. Mas nada lhe foi revelado. Ela estava, definitivamente, aflita. Ou era boa atriz. Voltou-se para o cano da arma. Segurando a arma, um estranho. Corpanzil, musculoso, olhar fixo em si. Mirou no dedo a afagar o gatilho. Voltou-se para o cano da arma. Não lhe parecia que tremia. Mas sentiu líquido a queimar-lhe as coxas, molhando suas calças. O homem em fração de segundos virou-se para G. e seu olhar dizia-lhe para conter o grito que anunciava, e não cumplicidade entre eles, que lhe justificaria tamanha violência. Quis falar, mas som algum emitiu. Não sabia a razão de ter sido agredido com tanto vigor. Mirou novamente o rosto do homem. Expressão alguma denunciada, a não ser a sua frieza. O certo, a impressão que teve, é que nunca o viu. Seu olhar, mirando o homem com a arma, buscava uma explicação. Mas o homem mostrava-se indiferente. Ouviu G. balbuciando "por favor, não faça isto. Pegue o que quiser, mas não faça isto." O homem voltou-se para G. Pareceu-lhe ainda ausente qualquer cumplicidade. O homem estava disposto apenas a fundar o terror: afinal, em nenhum momento mencionou os dólares, ou as jóias, ou o Audi estacionado. Em verdade, não mencionara nada. Disse ao homem que não tocasse em G. O homem aquiesceu, encolhendo os ombros. Agradeceu-lhe. Sabia que G. não seria tocada. Na firmeza do homem em agredir-lhe, sentiu que poderia nele confiar. Ouviu o estampido e sentiu queimar a fronte.
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Surpreendeu-se ao abrir a porta, projetando-se contra a parede. Um homem invadiu o seu apartamento, com uma espingarda na mão. O barulho chamou a atenção de R., que lhe acudiu. Foi, barrado, porém, por uma coronhada entre os olhos. Caído, R. tentou levantar,em vão. Não entendeu nada do que ocorria. R. olhou-a como se procurasse ajuda. Tentou gritar, mas o olhar do homem a impediu. A arma sempre mirada para R. Se tanto, e o que se lembra, disse ao homem que não fizesse mais qualquer violência, que levasse o que quisesse do apartamento. O homem a fitou, e logo entendeu que não era um assaltante. Imaginou, a princípio, que pretendia violentá-la. Mas viu o homem dar de ombros ao pedido de R. de que não a molestasse. Então o pior aconteceu-lhe: o tiro. O rosto de R. desfigurou em pólvora e sangue. Em seguida, o corpo abruptamente desmoronou sobre o piso enxadrezado, como se abatido uma peça qualquer. Sentia o cheiro da pólvora ainda quando se debruçou sobre o corpo. O sangue tingia sua blusa branca. Entre dedos, ao segurar a cabeça sem vida, miolos. Berrou o nome do morto, entre soluços, entremeando com palavras ininteligíveis. Voltou-se, sem muito se afastar do corpo, para pedir socorro, mas apenas viu as pernas do assassino sumir pela porta. Gritou por ajuda. Nem os passos do assassino mais eram ouvidos. Estava só, com o corpo. Estava sozinha. Correu ao telefone ligou para 198. Depois, sentada no chão, pernas dobradas, abraçadas, ficou a mirar o corpo, e se imaginou sozinha para sempre. A noite chegava com o seu luto.
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Sucumbiu o desgraçado com uma coronhada, ao vir socorrer a cunhã, que afastara de sua frente. "O que foi, G.?", pronunciou-se o desgraçado. Seus passos interrompidos com a coronhada, que o projetou para trás, até que colou a bunda no chão. Tentou levantar, mas o cano da escopeta o impediu. Virou-se para lado, para onde estava a cunhã. Voltou-se para o filho da puta, que olhou para cunhã como se buscasse auxílio. Seu olhar cortou o grito da cunhã. Ela ainda balbuciou que não fizesse aquilo, que levasse o que quisesse. Olhou-a como se dissesse que apenas queria a vida do filho da puta. Virou-se novamente para filho da puta, que, trêmulo, pedira que não fodesse a cunha. Apertou o gatilho, atingindo em cheio o filho da puta, que foi projetado para trás. Virou-se e dirigiu-se à porta pensando que seria bom foder aquela piranha. Mas não seria ela que o faria descumprir um contrato.
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Extraído do blog Confraria Tarântula

domingo, 11 de outubro de 2009

MPB INSTRUMENTAL


Toquinho - Especial Instrumental (1987)LupSom
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01 - Amor em paz (Toquinho - Vinicius de Moraes - Azeitona)
02 - Marina (Dorival Caymmi)
03 - Asa branca (Luiz Gonzaga - Humberto Teixeira)
04 - Garota de Ipanema (Tom Jobim - Vinicius de Moraes)
05 - Ai, quem me dera (Vinicius de Moraes)
06 - Bachianinha nº 1 (Paulinho Nogueira)
07 - Samba de Orly (Toquinho - Chico Buarque - Vinicius de Moraes)
08 - O vento (Dorival Caymmi)
09 - Berimbau (Vinicius de Moraes - Baden Powell)
10 - Chuva na praia de Juqui (Toquinho)
11 - Meu panamá (Mutinho)
12 - Chorando pra Pixinguinha (Vinicius de Moraes - Toquinho)
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Special Participation:
Azeitona (4)
Mutinho (11)
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Download: http://rapidshare.com/files/288794428/Toquinho_-1987-_Especial_Instrumental__320_.zip
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Fonte: Abracadabra-LPs do Brasil
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Baden Powell - O Grande Show Gravado ao Vivo (1979)
WEA-Atlantic BR 20.050/
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Disc 1
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01 - Canto de Ossanha (Baden Powell-Vinicius de Moraes)
02 - Samba novo (Baden Powell)
03 - Refém da solidão (Baden Powell-Paulo César Pinheiro)
04 - Petit valsa (Baden Powell)
05 - Tempo feliz (Baden Powell-Vinicius de Moraes)
06 - Se todosfossem iguais a você (Tom Jobim-Vinicius de Moraes)
07 - Asa branca (Luis Gonzaga-Humberto Teixeira)
08 - Eurídice (Vinicius de Moraes)
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Disc 2
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01 - Samba da bênção (Baden Powell-Vinicius de Moraes)
02 - A lenda do Abaeté (Dorival Caymmi)
03 - Valsa número um (Baden Powell)
04 - Tributo a Juazeiro (Baden Powell)
05 - Berimbau (Baden Powell-Vinicius de Moraes)
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Baden Powell - voice, acoustc guitar
Lilian Carmona - drums
Saulo Bezerra de Melo - contrabass
Don Bira - percussion
Jorginho Cebion - percussion
Record live at Teatro Procópio Ferreira - São Paulo (08-1979), "Encontro com Baden Powell"
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Download.
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Fonte: Abracadabra-LPs do Brasil 2

sábado, 10 de outubro de 2009

A longa tarde do vento quente

(foto sem crédito)


A longa tarde do vento quente

Outubro. A parada de ônibus mais quente do que a faixa no meio do asfalto, onde carros iam e vinham não sei de onde nem pra onde naquele colosso de calor. Qualquer sensatez humana ficaria em casa a aceitar o desafio de uma condução "circular" de ônibus à universidade, ufpi, onde eu cursava letras.
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Lembro que cheguei na sala de aula, não havia nenhum aluno ainda, nem professor. Cruzei os braços sobre a carteira, aninhei a cabeça neles e logo dormi.
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Lembro também da minha longa viagem com o sol. Primeiro eu entrei no ônibus. O motorista era velho, tinha olhos amarelos e brilhavem. Nunca vi olho de velho brilhar. O cobrador dormia no alto do caixa. Meti um vale estudantil no buraco do ouvido dele e empurrei a catraca numa engrenagem barulhenta que só fez esquentar mais ainda o calor. Quando levantei os olhos vi todas as cadeiras vazias. Sentei-me numa cadeira onde eu sabia que os solavancos jogaria o sol para o outro lado. Deu tempo de brir o livro do Chandler, no conto: "A longa noite do vento quente". O calor, o sono, a fadiga deviam de ter derrubado o livro longe. Entre o sono e o calor ouvi uma voz feminina, ao meu lado.

-- Tarde quente!
-- É, muito quente...
O vento quente, a sede, o sono, a janela pequena para se atirar ao suicídio no asfalto.
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O motorista solavancando marchas e mais marchas, acelerando fumaça, peidando ar-comprimido em cada parada que ninguém entrava, o sono, o calor insuportável.
-- Mas tá muito quente, não tá, não? Perguntava ela.
-- Insuportável, o calor.
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Na curva da Maranhão para a Av. Atonino Freire caí nos ombros dela e fechei os olhos, senti o vapor do desodorante que lubrificava o sovaco dela e me veio o sono mais pesado ainda. Quando a arquitetura de uma nuvem sombreou a cidade, parecia tudo ter se ressussitado. Eu apenas me arqueei, mecânicamente, de volta ao meu posto, alinhando-me na cadeira. Naquelas alturas sonolentas, acho que meu nariz beirava as coxas da moça que perguntou:
-- Calor horrível, não?
-- Muito calor danado, falei, idiotamente.
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Foi quando ela puxou o cordão ao alto pedindo parada. Deu para ver que era a parada do CCHL, da UFPI. Vi, com muita dificuldade, quando ela ajeitou a saia, arrumou os livros e se levantou. Eu com alguma consciência sabia que deveria descer nos blocos antigos da universidade.
-- Tarde quente, enhein...?
-- Muito quente, respondeu o besta.
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Há na via que dá acesso aos blocos antigos da universidade um balão fechadíssimo que carro só curva com vinte ou trinta quilômetros. O motorista do olho amarelo girou a direção como oitenta e eu caí lá onde o sol se sorria.
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Quando acordei, na sala de aula, o professor de português, Airton Sampaio, falava sobre a importância da comunicação, do canal da comunicação. "Alô?" - "Alô!".
E o professor, com exercício da prática literária, como exemplo, contava:
"Um sujeito idiota sentou na cadeira de um ônibus e uma garota belíssima sentou perto dele e falou só para testar o canal da comunicação:
-- Pôxa, como tá calor, não tá não?
--Tá um calor dos diabos!"
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Mais tarde, no antigo bar "Nós e Elis", eu bebia uma cerveja no balcão quando uma garota se aproximou. Não a vi, mas o cheiro era feminino, meu nariz não mente. A voz que pediu campari, a voz rouca de substância musical, me acendeu um sol de tantos que queimaram minha orelha nas janelinhas de ônibus de Teresina. Olhei para ela, estava com sorriso provocador, mas também de impossível. Reconheci o cabelo louro que o vento de outubro soprou dentro de um dia num dos malditos ônibus nas ruas de Teresina.
-- Dia quente, disse ela.
-- Muito quente, falei, otariamente.
Com gotinhas de suor sobre a ponta do nariz ela se desprezou de mim, no mais perdido aceno de adeus. Não seria um aceno de calor?
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f wilson

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Chet Baker "Chet" (1958)

Chet Baker "Chet" (1958)

Pessoal:
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Chet Baker: Trompeta
Pepper Adams: Saxo Barítono
Herbie Mann: Flauta Traversa
Kenny Burrell: Guitarra
Bill Evans: Piano
Paul Chambers: Contrabaixo
Philly Joe Jones: Bateria
Connie Kay: Bateria.
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Download: http://rapidshare.com/files/199973003/CBC.rar
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Fonte: MP3 JAZZ ( http://buenojazz.blogspot.com/ )

sábado, 3 de outubro de 2009

Novo conto no blog Tarântulas

(fotos sem crédito. montagem de f wilson)

Por J. L. Rocha do Nascimento
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Vim assim que soube. Amigo de infância. Logo que cheguei, aquele constrangimento.
Aproximei-me para vê-lo mais de perto. Fui interrompido por um acesso de tosse.
Não conseguia parar. Meus olhos lacrimejavam, faltou-me o fôlego. Passada a crise,
percebi que as velhas senhoras tinham parado de rezar o terço. À minha volta, todos me olhavam fixamente, com ar de censura ou de advertência. Ou era de comiseração? Não esperei a resposta. Sai dali imediatamente. De fininho e envergonhado. E adivinha o que estou fazendo agora, aqui do lado de fora que está mais ventilado e de onde a muito custo posso identificar a quantas trezenas vão de ave-marias? Prometeu parar. Eu também, diversas vezes. O máximo que consegui, numa delas, três meses. Por esse tempo eu ficava, como se costuma dizer, fumando nas calças. Carcinoma bronco-pulmonar. Quando soube, para melhorar a estima, ainda quis fumar um, o infeliz. Na manhã de hoje, quando acordou, contou-me sua mulher, estranhamente não sofreu. Olhou pro firmamento e fez um comentário. Nesse momento algumas nuvens tingiam de negro o azul do céu. Preferia não saber, foram suas últimas palavras.
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Foi por causa dele que comecei, ainda no ginasial. Por pouco não me livrei. Tinha dificuldade, engolia muita fumaça. Ele insistiu e o fez com um argumento infalível. Ajuda a conquistar uma garota. Quando a gente está sem assunto. Serve pra quebrar o gelo, distrair. Enquanto traga, vai pensando no que falar.
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Mas minha paixão inicial foi mesmo pelas embalagens. Quando criança, lá pelos oito ou dez, tinha um vizinho que gostava de Minister. Feito para o homem que sabe o que quer. Certa vez ele me deu um maço vazio. Comecei minha coleção. A gente transformava em notas. Isso depois de um cuidadoso trabalho. O jogo era desfazer a embalagem sem rasgar ou danificar. Primeiro descolava. Depois dobrava as laterais em direção à parte interna, mais ao menos na largura do dedo mindinho. Em seguida, com o polegar, e a mesma paciência de mãe ao passar a camisa de cambraia de pai, pressionava em ambos os lados para vincar bem. Ao final, dobrava ao meio, como se faz com as cédulas. Na bolsa de apostas entre os meninos da rua, Minister valia mais que Hollywood, cinco vezes uma Continental com filtro. A de menor valor era a do Gaivota. Índice de rejeição altíssimo, porque era o mais barato àquela época e não tinha filtro. A mais rara e valiosa era a carteira de Cônsul, mentolado e meio doce, um pouco enjoativo. Tinha uma vantagem. Bom para namorar, falar de perto, diziam os acima de meu tope. E era mesmo. Antes de conhecer, quando eu queria beijar, depois de umas tragadas, eu sempre chupava bombons piper. Com o Cônsul não havia com que se preocupar, podia beijar sem medo.
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Saudades daquele tempo, quando tudo era muito inocente e romântico. Assim como no cinema. Filme em preto em branco tinha que ter fumaça. Sem um entre os dedos nunca haveria uma mulher como Gilda. E nem como Rita. E aquele olhar oblíquo, impetuoso, de femme fatale da Lauren Bacall pro Bogart? O instante entre o riscar e o acender. Impagável. Nunca esqueci.
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Os tempos são outros. Não existe mais aquele glamour. A cada dia o cerco se fecha ainda mais. Pra onde você se vira tem uma placa de espaço livre. Tem dias que eu me sinto como um cão vira-lata, ninguém quer por perto. Acho que ele também se sentia assim. Pertencemos a uma raça em extinção. Eu e o cinzeiro. Outro dia, numa festinha, rodei a casa toda à procura de um. Não encontrei. Tive que me virar com um copo descartável.
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Quanto à tosse? Está sob controle. Não sou do tipo que é facilmente surpreendido. Não dou moleza pro azar. Faço visitas regulares aos médicos. Já a investigaram. Enfisema intersticial, uma bobagem. É certo – e esse detalhe eu omiti – que às vezes vem acompanhada de alguns coágulos avermelhados. Minha mulher diz que são de sangue. Eu digo que são margaridas que meu organismo não consegue digerir e são expulsas. É a palavra dela contra a minha. E enquanto isso, pra organizar as idéias, vou fumando. Enquanto ainda é permitido fazê-lo em alto-mar.
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Extraído do Blog Tarântulas

Keith Jarrett - Whisper not (live in Paris 1999)

Keith Jarret - Whisper not (live in Paris 1999)
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Disc 1
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1. Bouncing With Bud 7:31
2. Whisper Not 8:04
3. Groovin’ High 8:29
4. Chelsea Bridge 9:46
5. Wrap Your Troubles In Dreams 5:46
6. ‘Round Midnight 6:43
7. Sandu 7:26
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DOWNLOAD CD1:http://rapidshare.com/files/166894371/PQP_Jarrett_Trio_Whisper_Not_1.rar
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Disc 2
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1. What Is This Thing Called Love? 12:22
2. Conception 8:07
3. Prelude To A Kiss 8:14
4. Hallucinations 6:34
5. All My Tomorrows 6:22
6. Poinciana 9:09
7. When I Fall In Love 8:06
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DOWNLOAD CD2:http://rapidshare.com/files/166912585/PQP_Jarrett_Trio_Whisper_Not_2.rar
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Keith Jarrett, piano
Gary Peacock, baixo acústico
Jack DeJohnette, bateria e percussão

Fonte: P.Q.P. Bach (http://pqpbach.opensadorselvagem.org/)

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Shostakovich - Chailly - The Jazz Album

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Dmitri Shostakovich (1906-1975)
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Jazz Suite No. 1Op Piano Concerto No. 1 in C minor,. 36
Jazz Suite No. 2 (Suite para Orquestra Promenade)
Tahiti Trot (Tea for Two)
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Ronald Brautigam, Piano
Peter Massagistas, Trompete
Royal Concertgebouw Orchestra
Riccardo Chailly, Maestro
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Download:
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