sábado, 31 de março de 2012

Uma frase para a imagem


Conto@otnoC

(Foto: google)

Ecos de uma infância

Por J. L. Rocha do Nascimento* 
 
As folhas secas varridas do chão levantam vôo. Um gato, rápido, dobra a esquina (vi a ponta do rabo preto) e se esconde num canto qualquer da velha casa. Minutos depois, ainda o vento. As folhagens das mangueiras tocam-se umas nas outras, se cumprimentam, fazem festa. Vem chuva aí. Por enquanto, pingos, apenas pingos, um aqui outro acolá. Na minha cabeça, um deles explode. Olho pro céu. Um clarão parte no meio a nuvem negra. No instante seguinte, o chão estremece sob meus pés. O velho vira-lata, que mal arrasta a pata, não se assusta mais. Deus ralhando com São Pedro. Mais pingo pingando. Ergo mais a cabeça. Escancaro a boca. Um deles, que eu aparo com a língua, com o impacto, se transforma em estilhaços. Doce. O crepitar no telhado. Agora sim, é chuva. Sonora. Caí do céu, escorrega pelo chão. De volta, aquela infância. O cheiro de terra molhada. Fofa, fina, revirada. O banho de bica. A bronca de mãe. O grito de pai. Noite de febre. Minha tia e sua reza forte. Na manhã seguinte, o riacho cheio.
 
 
* Do blog Confraria Tarântula


sexta-feira, 30 de março de 2012

quinta-feira, 29 de março de 2012

Tempo de Poesia 2

(Corações - F Wilson)


Intervalo (fragmento)


Um copo suicida quebra a noite
Cacos afiados refazem as horas
Passos, olhares, sedução
Só uma noite
O resto é com o destino
Uma é pouco
Duas é bom
Três e dez mais!
Nenhuma é o preço
Mais caro da festa

Burburinho
Milhões de palavras
Aguadas com cerveja
Garçom apressado
Nem peço
Sou mesa de uma boca só
Vou bebendo pensamento
acordes de guitarra
Acompanham meu pensamento
Cada momento personificado
Em hard ou progressivo setenta
(Pelo menos bloqueia o pagode
Dos jovens na mesa vizinha)
Cemitério de memórias
Toda e qualquer ação desastrosa do poeta
É perdoada pelo tempo
 
No meio do caminho
Havia uma nuvem de sonhos
Longos cabelos negros
Movimentos na neblina
O rosto adolescente eternizado na memória
Que emoção fez dobrar essa ruga
No seu rosto de mulher?
 
Intervalo de dança
Concentração tribal
Sussurros à mesa
Gestos medidos
Olhares perdidos
Nada comprometido
Amar é ficar

Podem-se enfileirar centenas de garrafas
Até dobrar a esquina do tempo
É lá onde espero uma cerveja
Para molhar o meu pensamento
Tento me convencer que o tempo
É só uma convenção humana
Subtraindo horas de vida
Só uma besta humana
Inventou duas pernas de relógio
A perseguir o tempo
Só um gênio humano
Inventou a fotografia
Capaz de parar o tempo
 
Eia, paciência...
A emoção sopra no buraco da sorte
Em busca do momento perfeito
Enfim um garçom gentil:
Só vi a garrafa
Caindo feito chuva no sertão
Destampado rápido:
Schiii...Plop!
Senti a fumacinha gelada na alma.
Um sorriso do garçom
Um brinde a nossa idade
 
Um sorriso de calcinha
Rápido no cruzar de pernas
Só indo ao banheiro
(Não é nada do que você
Deve estar pensando)
Banheiros conjugados:
Um muro separando
A humanidade em dois sexos
Do outro lado as mulheres
Falam mais
Segredam, sorriem sobre jatos
Urinam mais
“Melhor calcinha.”
“fundilho molhado”
“Mais molhada ela vai ficar.”
Assim não dá!
Grita o meu pau
Seguro-o pelo pescoço
Descontrolado põe em fuga
Cidadãos mijando porta afora
Sorrio feito tarado louco
  
Agora uma chuva
Anunciando seus trovões
Todo ano tem seu janeiro
Diferente de ser
Todo homem tem seu jeito
.........................................
Minha mente ameaça:
Neurônios-bombas, alerta geral!


Que nada, intervalo de uma cena
Uma cerveja no bar do tempo
Girando um disco do Roberto Carlos
Em 1969
69?
Uma bolha de uva explode
No céu da minha boca
Solidão é cascalho de precipício


Lembro da Lili, Liliana,
vida via dourada
Namorada apaixonado do vento
A empoeirar
Gramas de beleza pela rua
(Quem era eu a persegui-la
Na tentativa
De colher um fio perdido do seu cabelo)
Era 1975
Dez anos
Antes
Trancinha era seu cabelo de menina
Que se desfez em transa
Penugem feminina
Relva abrindo em flor
Orvalho em dia de calor

 
Depois foi Amanda
TV preto-e-branco
Canal do tempo
Tela corpo belo
Pele branca
Buceta preta
Corte aberto
Hora incerta
Sexo quente
Goza lento
Cospe dentro
“Me’spe...ra...
Ama...am...ãããã...”
Anda... sua puta!

Amanda nua
suculenta
Grito puro:
Me’spe...ra...

Outra volta
No teu corpo Amanda
Qual descompasso avança
Sobre coração emocionado?
Extremidades exterminam razão
Na superfície da tua pele
Dez pontas de dedos
Mergulham no desejo
Fagulhas que tu chamas
Quantos quilômetros de pêlos
Hei de atravessar
Quantos dias quantas noites
Para jorrar dez segundos
De água abundante
A vida solavanca dentro dessas veias
Amor, sexo, amor, sexo, amor, sexo...
Pre...
        enche
Pre...
        nha

Fornalhas
Úmidas

Côn cavo
        Con vexo
Côn cavo
        Con vexo
Côn cavo
        Con vexo
Côn c...
....... Ahhhhhh!



Amanda, onde estás?
O tempo voraz lambeu
O doce que tinhas na pele
E o perfume do desejo
Secou nas pétalas de uma flor
Socada entre tantas páginas
Dos contos pôrnos do Henry Miller
Ensurdecidos dos teus gemidos
Engessados de tantas quedas
Jogados da cama enlouquecida

.........................................................

F Wilson

Tempo de Poesia

(imagem: autoria desconhecida)


Canção de março


A palavra agora se traduz em dor
Antes, luz e caminho
Névoa ao abrir a janela
Pluma de algodão no campo.


A palavra agora se comporta em dor
Antes, sopro agradável
Vela em castiçal na sala
Jantar farto sobre a mesa de alecrim.


A palavra agora é depósito de dor
Antes, odor de menina em flor
Lençol dividido em noite de chuva
Vontade, vontade, vontade...


A palavra e a dor
Antes
Certeza
Tarde.


Emerson Araújo.


 Poema extraído do Blog Legal - Expressão em Mote