sábado, 5 de julho de 2008

Na sala de aula

O SEQUESTRO

A capainha tocou matando a impaciência. Já tava todo mundo de mochila nas costas e a professora nem teve tempo de concluir o assunto. A gente gostava dela, mas o tempo dela acabara. Suspirou fundo, mas ela sabia que criança nunca tolerava conversa após o horário de saída - acho também que era um suspiro de quem merecia uma hora de descanso. Ainda olhei para ela e dei um thau com o olhar de aluno apaixonado pela professora.
Na calçada da escola o congestionamento de sempre. Carrões em fila dupla esperando os filhos. Motoristas impacientes buzinado e botando a culpa no guarda do Detran. Xingamentos, ameaças. Rico não tem paciência de esperar, mas ali o dinheiro deles não comprava a mãe de ninguém.
Eu sempre saía correndo daquela confusão para caminhar tranqüilo a uns cinqüenta metros adiante na calçada. O sol do meio-dia batia quente e eu arranhava as costas na sombra das paredes até a parada de ônibus. Ainda na calçada da escola avistei a cena: saindo de uma camionete hilux cinza dois homens encapuzados abordaram uma menina na calçada e a jogaram dentro da hilux. Um encapuzado ainda sondou a área antes de entrar no carro e saíram em disparada. Suando mais do que devia, saquei tudo. Tratava-se de um seqüestro. Eu conhecia a menina do colégio. Também lia muitos livros de aventuras.
Sem perder de vista a hilux e esperando o momento certo para me lançar no meio da rua, meus instintos de heroísmo se confundiram com juízo de cidadania que a professora tanto ensinara.
- Ta louco, menino, quer morrer, sai da frente! Gritou o homem do honda preto.
Com a mão estendida gritei, abafando a voz dele.
- Escute, moço, uma menina foi seqüestrada nesse instante, tá indo naquela hilux cinza dobrando a esquina.
Ele viu rapidamente o carro cantando pneus na curva
- Entra aí, garoto! Era um senhor inteligente.
Entrei no honda batendo porta. Os pneus atritando asfalto.
- Me dá o teu celular para acionar a polícia. Falei.
Uma menina se inclinou do banco de trás e colocou o celular na minha mão. Era uma menina loura. Disquei o 198 e comuniquei o fato on-line. O policial que atendeu disse que precisava da confirmação de alguém maior de idade.
- O senhor é maior de idade? Falei, entregando o celular do moço que dirigia feito filme americano perseguindo bandido.
- Policial, quem fala é o juiz Anderson da segunda vara criminal, estou na avenida Frei Serafim perseguindo seqüestradores e se você duvidar vá se fu...
Ele não terminou de falar, jogou o celular e bateu o carro.
Não vi mais nada.


F. Wilson


Nenhum comentário: